Dos campos à mesa, por onde passa o café?
26 de dezembro de 2024, às 14h25 - Tempo de leitura aproximado: 4 minutos
Tem quem não viva sem. O café, muito presente no dia do brasileiro, também é parte importante da rotina das profissões abrangidas pelo Sistema Confea/Crea e Mútua. Em São Paulo, terceiro estado que mais produz o grão, é na Alta Mogiana que estão situadas cerca de 5 mil fazendas de café. A região, composta por 15 municípios, é certificada pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) e tem reconhecimento mundial no mercado cafeicultor.
São milhares de hectares cultivados ao longo de mais de 200 anos de uma tradição em que a excelência do produto local compreende toda a cadeia, da plantação ao comércio, e resulta na qualidade do café que vai para a xícara do consumidor. Para que a bebida seja bem classificada, o grão é avaliado em diferentes categorias que consideram tipo, atributos físicos e defeitos, entre outras análises. Mas, o que pode ser entendido como defeito em um café?

Esse é um dos pontos em que a atuação da Engenharia e da Agronomia se faz necessária. Isso porque a Classificação Oficial Brasileira (COB) determina, em tabela, a equivalência de grãos imperfeitos e impurezas, indicando o nível de qualidade. “Quando se faz um café, parece que todos são a mesma coisa, mas não é bem assim. É por isso que é na sala de classificação que tudo acontece”, comenta o Eng. Agr. Gustavo Leonel, responsável pela Fazenda Bom Jardim, referência em café orgânico, localizada em Franca.
Essa categorização depende de uma csérie de fatores. Dentre eles, a variedade da espécie, o manejo do cultivo, a umidade e a irrigação do solo, e os subprodutos – os defeitos – que acompanham os grãos, como pedras, cascas, folhas, outros frutos etc. “Essas são, na verdade, as impurezas. Cada item entra na graduação de defeitos, mas não é um defeito por gosto pessoal, e sim de uma classificação universal”, detalha.
O engenheiro agrônomo conta, por exemplo, que é comum que o café de combate – como são conhecidos os mais comuns, encontrados nas prateleiras dos supermercados – precise do açúcar, já que é torra é tão alta que dá o amargor à bebida na tentativa de transformar todos os elementos, sejam os grãos ou os subprodutos, em uma coisa só. “O café que não tem defeito, não precisa adoçar para tomar”, afirma.
A diferença entre um e outro, além da nota atribuída após avaliação, pode ser percebida nos rótulos. As embalagens recebem chancelas, em forma de selos, da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic) e da Associação Brasileira de Cafés Especiais (BSCA). Isso não quer dizer, no entanto, que o café tradicional é ruim ou faz mal à saúde, visto que a legislação limita uma porcentagem de impureza permitida.
Agricultura regenerativa
A produção também requer do profissional o olhar para os desafios externos. Na safra de 2024, o cultivo foi afetado por uma grande seca. “Tivemos um impacto de 30% a 40% na produção aqui da região. A saca, que antes custava mil reais, passou para R$ 1,6 mil”, diz o Eng. Agr. Roberto Maegawa, inspetor chefe da Comissão Auxiliar de Fiscalização (CAF) do Crea-SP em Franca.

Os efeitos, assim como no circuito produtivo, também se dão em cadeia, gerando consequências nas vendas e na economia regional. Os pequenos e médios produtores sentem ainda mais, por isso a importância da atuação integrada do setor e da presença dos responsáveis técnicos para viabilizar alternativas capazes de solucionar esse tipo de problema.
Na propriedade da Eng. Agr. Maria Fernanda Malvicino Nogueira, inspetora especial do Crea-SP por Franca, a aposta tem sido na agricultura regenerativa. O conceito resgata os princípios da cultura orgânica e propõe melhorar a saúde do solo ao mesmo tempo em que promove a biodiversidade, buscando um equilíbrio mesmo diante de situações adversas. As estratégias vão desde a rotação de cultivos com adoção de plantas de cobertura à redução de arado do solo e à integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF).
No terreno, em Cristais Paulista, a vegetação nativa compõe o cenário. São pés de manga e jabuticaba distribuídos entre outras árvores frutíferas e feijões-de-porco em meio ao café, além das 16 mudas recém chegadas pelo projeto piloto de descarbonização do Conselho (leia mais aqui). “Sempre gostei de estar em contato com a natureza. Desde que me formei, trabalho com agricultura orgânica, onde não há uso de defensivos agrícolas. Operamos a interação de todos os microorganismos”, menciona a engenheira agrônoma.
Decisões como essas, tomadas nas fases de plantio, cultivo, beneficiamento e torra, têm reflexo no produto final. “Desde 2016 atuo na qualidade do café. Meus avós e meus pais fizeram bem feito, mas não havia um norte ou um roteiro. E, no mundo moderno, é preciso cumprir certas exigências. Meu trabalho é trazer o que temos de melhor das fazendas para os lotes de café”, finaliza Gustavo.
Produzido pela CDI Comunicação