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Disponível em <https://www.creasp.org.br/noticias/falha-na-obra-ou-no-uso-desafios-de-a-pericia-identificar-origem-do-vicio-e-de-quem-e-a-responsabilidade/>.
Acesso em 13/10/2025 às 02h49.

Falha na obra ou no uso? Desafios de a perícia identificar origem do vício e de quem é a responsabilidade

Especialistas abordam dificuldades práticas em diagnósticos, rigor técnico e conceito de vício construtivo na 80ª Semana Oficial da Engenharia e da Agronomia

10 de outubro de 2025, às 11h18 - Tempo de leitura aproximado: 4 minutos

No painel de “Vícios Construtivos”, durante a 80ª Semana Oficial da Engenharia e da Agronomia (SOEA), os engenheiros civis Fabiana Albano Russo de Melo, Frederico Correia Lima Coelho, Tércio César de Queiroz Filho e Luciano Ventura  debateram o momento de intensa atualização técnica e de crescente pressão judicial pelo qual passa o universo da perícia de Engenharia na construção civil. À luz da recém-revisada NBR 13752/2024, os especialistas destacaram a importância de haver método investigativo técnico para diagnosticar falhas de construção e identificar responsáveis.  

A Eng. Civ. Fabiana Albano (Ibape/SP) focou no conceito de vício e sua correta classificação. Ela explicou que um vício é uma anomalia que afeta o desempenho de produtos ou serviços, impactando requisitos de segurança, habitabilidade ou sustentabilidade. Um problema que não cause perda de desempenho, como a diferença no tipo de granito especificado, não é vício, mas sim uma não-conformidade.  

Fabiana classificou o vício construtivo como uma anomalia endógena, que nasce com o sistema (origem no projeto, execução ou especificação do material). Ela ressaltou que a perícia de vícios se enquadra na “Vistoria de Análise de Causalidade”, exigindo um “método investigativo tecnicamente fundamentado”. “Toda anomalia tem uma história. É preciso haver o mecanismo de atuação em patologia e as eventuais responsabilizações”, afirmou.  

O Eng. Civ. Frederico Correia Lima Coelho (Ibape/MG), coordenador da revisão da NBR 13752/2024, que durou sete anos, detalhou o aspecto procedimental da perícia. Ele enfatizou que a perícia é uma atividade técnica realizada por profissional habilitado e desenvolvida de forma fundamentada.  

O professor detalhou as etapas do trabalho, começando por anamnese (conversas e análise histórica) e coleta de dados e documentos (que pode incluir vídeos e relatos de vizinhos sobre o histórico da ocorrência). Ele frisou a importância da caracterização e descrição técnica detalhada das manifestações patológicas, incluindo seu dimensionamento (altura, largura, localização exata), pois essa informação é vital para o orçamento de reparos. Ao apurar a extensão dos danos, Frederico orientou que o perito deve apresentar, de forma fundamentada, duas ou mais hipóteses alternativas de solução ou custo (por exemplo, pintar só o local afetado ou o cômodo inteiro), para que o julgador possa decidir. 

 

Divisor de águas: falha na obra ou no uso?   

O Eng. Civ. e Adv. Tércio César de Queiroz Filho, vice-presidente do Ibape Nacional, abordou o desafio de distinguir vícios de construção de problemas gerados após a entrega da obra (o marco zero). Ele destacou a obrigação de o proprietário ou administrador implantar um sistema de manutenção periódica (de acordo com o NBR 5674 da ABNT) e de manter registros de intervenções.  

Tércio afirmou que a deficiência ou a ausência desses registros gera degradação precoce e transfere a responsabilidade para o usuário. Um dos grandes desafios do perito é atuar como investigador em meio a uma “tempestade de informações” conflitantes e detectar reformas ou acréscimos posteriores à entrega (como ampliações em condomínios que anulam a garantia da construtora). Em seu caso concreto, que envolvia uma perícia 14 anos após a construção, o especialista demonstrou que problemas em alvenarias foram causados pela ausência de tela ou malha de ancoragem entre a estrutura pré-moldada e os pilares, e não por falha de uso.  

 

Judicialização em Massa e Inovação Tecnológica   

O Eng. Civ. Luciano Ventura, presidente do Ibape Nacional, trouxe um olhar sobre o impacto social e judicial da má caracterização dos vícios. Ele revelou que o Brasil enfrenta um número assustador de processos, com quase 160 mil demandas judiciais na Justiça Federal, a maioria ligada ao programa Minha Casa, Minha Vida (Faixa Um). Segundo Luciano, muitas dessas demandas são petições repetidas, usando laudos genéricos que classificam incorretamente falhas de manutenção como vícios construtivos.  

Para combater essa situação, o Ibape tem trabalhado com o judiciário na padronização dos laudos e quesitos. Ele enfatizou a relevância da Resolução CJF 956/2025 do Conselho da Justiça Federal, que agora prioriza a nomeação de peritos com certificado de capacitação sobre vícios de construção. Luciano também destacou o uso de tecnologia na perícia, como o drone para inspeção detalhada, câmeras com LiDAR para levantamento de pontos e o potencial da Inteligência Artificial (IA) para gerar modelos 3D de edificações. 

O painel foi moderado pelo Eng. Mec. Gutemberg Rios, conselheiro do Confea e presidente do IBAPE-DF. 

 

Produzido por CDI Comunicação 

 

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