Marca do Crea-SP para impressão
Disponível em <https://www.creasp.org.br/noticias/por-que-as-maquinas-nao-vao-substituir-profissionais/>.
Acesso em 15/06/2025 às 07h06.

Por que as máquinas não vão substituir profissionais

Especialistas fazem análise sobre avanço de IA no Brasil

1 de março de 2023, às 10h16 - Tempo de leitura aproximado: 8 minutos

A cada nova Inteligência Artificial (IA) criada, surgem questionamentos sobre o futuro dos seres humanos diante de sistemas cada vez mais complexos e próximos da racionalidade e interação que, até então, só as pessoas eram capazes de entregar. Uma pesquisa feita pela IBM (International Business Machines Corporation), empresa americana de informática, mostrou que 41% das companhias brasileiras utilizam, de alguma forma, a tecnologia, seja para se proteger de ameaças cibernéticas ou para automatizar e agilizar processos.

 

Com o avanço na adoção de tais ferramentas – o estudo revela ainda que 66% dos profissionais de Tecnologia da Informação (TI) indicam que suas empresas estão implementando IA ou têm planos para isso –, é comum o receio sobre a relação com as máquinas. Os especialistas, no entanto, tranquilizam os ânimos ao indicar que o futuro é de integração. “O objetivo da IA é melhorar a vida humana, aumentando a produtividade e reduzindo a necessidade de tarefas repetitivas”, explica o professor Eng. Eletric. Fábio Gagliardi Cozman, diretor do Centro de Inteligência Artificial da Universidade de São Paulo (USP).

 

Já para a Eng. Prod. Marcela Vairo, diretora de Dados, IA Apps e Automação na IBM Brasil, a tecnologia abre um mundo de possibilidades nos mais variados mercados e, por isso, não deve ser vista como ameaça. “Depois dos profissionais de TI, que englobam 54% dos grupos que usam IA dentro das empresas, logo na sequência estão os engenheiros de dados (35%), cientistas de dados e desenvolvedores (29%), profissionais de segurança (26%), fora os profissionais de marketing, gerentes de produtos, de vendas e RH, entre muitos outros. A lista é bem diversificada”, conta. Os interessados devem conhecer programação e elementos básicos de estatística, além de ter uma sensibilidade para questões de proteção de dados e de proteção de privacidade.

 

Em entrevista ao Crea-SP, os engenheiros compartilham suas análises e previsões sobre o cenário do tema aqui no Brasil. Confira:

 

Quais são as qualidades dessas ferramentas e os ganhos esperados pelas empresas que as implementam?

Marcela Vairo – Expandindo a visão de oportunidades, a IA pode ajudar nos mais diversos tipos de soluções adequadas às necessidades de cada negócio. Atualmente, além dos atendimentos através dos assistentes virtuais, a IA pode ser utilizada, por exemplo, para analisar e acessar dados climáticos para melhorar a precisão da produtividade de safras para o agronegócio, assim como melhorar a previsão de geração de energia renovável, com o uso de inteligência artificial e de análises de dados geoespaciais e meteorológicas, hospedados na nuvem. A IA aliada às soluções de nuvem híbrida, IoT (internet das coisas), 5G e Machine Learning (aprendizado de máquina) pode ampliar a gama de possibilidades e proporcionar soluções cada vez mais personalizadas para os mais diversos segmentos econômicos. Vemos também um uso cada vez maior na IA em soluções para combater ataques cibernéticos, que infelizmente aumentaram drasticamente nos últimos 18 meses. E finalmente, uma busca cada vez maior das empresas por soluções de IA que ajudem a automatizar seus processos e monitorar sua operação de TI de forma cada vez mais inteligente e proativa.

 

Alguma cidade se destaca no uso inteligente da tecnologia?

Fábio Cozman – Há várias cidades com boa base tecnológica em inteligência artificial, como São Paulo, Belo Horizonte e Florianópolis. Mesmo em cidades menores há bastante atividade, como em Piracicaba, onde há muita atividade ligando inteligência artificial e agronegócio. O Brasil tem investido na pesquisa em inteligência artificial há várias décadas e tem uma comunidade acadêmica bastante atuante; índices internacionais mostram o país entre o 10º e o 15º colocados na produção de artigos sobre o tema. Na última década, essa tecnologia passou a ter bastante sucesso prático, o que levou à criação de muitas startups e de vários grupos de trabalho em empresas de grande porte. Um estudo de 2019 já indicava, naquele momento, mais de 700 startups na área.

 

Por falar nisso, qual a avaliação que fazem sobre o desenvolvimento de IA pela Engenharia brasileira em relação aos outros países?

FC – O Brasil tem profissionais bastante competentes na área e oferece muitas oportunidades. A tecnologia de inteligência artificial hoje é baseada em processamento de grandes quantidades de dados, e temos uma infraestrutura de dados razoavelmente bem construída, com muitos órgãos públicos que produzem informações confiáveis e com uma legislação de proteção de dados moderna. O setor deve crescer significativamente, o que exigirá talento em computação e no gerenciamento de grandes quantidades de dados e de computadores. O setor já produz uma variedade de produtos, de chatbots a sistemas de visão computacional. Outros exemplos de produtos para exportação são jogos para computadores/celulares e produção industrial com alto grau de automação.

 

MV – Não há dúvidas que hoje a IA é latente no país e indubitavelmente tem transformado operações múltiplas, deixando áreas diversas de conhecimento mais eficientes e produtivas – sendo a Engenharia uma delas. No Brasil, a adoção da tecnologia em 41% das empresas, segundo nosso estudo, fica acima da média global, de 34% das companhias apostando em IA. Mais do que isso, vemos que esses profissionais brasileiros querem incorporar a inteligência artificial em suas iniciativas de sustentabilidade e, entendo, que a Engenharia com práticas ESG está impactando diretamente na competitividade das indústrias.

 

Há outras áreas que estejam investindo nessas tecnologias? Como percebe essa movimentação no mercado?

MV – Além das áreas comerciais de serviços em tecnologia, a IA pode ser utilizada para as mais diversas possibilidades e conseguimos atestar isso inclusive pelos profissionais que têm utilizado a tecnologia em todo o mundo. Depois dos profissionais de TI, que englobam 54% dos grupos que usam IA dentro das empresas, logo na sequência estão os engenheiros de dados (35%), cientistas de dados e desenvolvedores (29%), profissionais de segurança (26%), além de profissionais de marketing, gerentes de produtos, de vendas e RH, entre muitos outros. Muitos desses profissionais estão usando a tecnologia para lidar com a escassez de mão de obra e a falta de skills e aqui trago alguns exemplos interessantes: 65% usam as ferramentas para reduzir as tarefas manuais repetitivas, 50% para o aumento de treinamento e aprendizado para os funcionários e 45% para melhorar o recrutamento em Recursos Humanos.

 

Como fica a questão da segurança de dados, a violação de direitos? E como evitar possíveis julgamentos ou vieses?  

FC – Esses tópicos têm sido discutidos no mundo todo e ainda não existe um conjunto definido de regulações e nem um consenso sobre como atuar. Existem várias questões que já têm resposta: a proteção de dados deve cumprir a LGPD, os produtos devem satisfazer o código de proteção ao consumidor, e nenhum programa pode ultrapassar limites legais. A boa prática de coleta e processamento de dados deve ser conduzida de maneira a evitar viés e discriminação. Muitas questões éticas sobre como uma máquina deve tomar certas decisões, ou questões sobre quem é responsabilizado em caso de falha, ainda não foram inteiramente exploradas na literatura internacional. É preciso agir com bom senso e cuidado enquanto esse debate se desenrola.

 

MV – Com a IA impactando diretamente a vida das pessoas e negócios, em um crescimento substancial no país, organizações e provedores que usam a tecnologia têm a responsabilidade de desenvolver sistemas de confiança que garantem que a inteligência artificial seja projetada e utilizada de forma responsável ao longo do seu ciclo de vida. Ou seja: uma IA ética e confiável é inegociável. É fundamental o trabalho com uma equipe diversa no desenvolvimento de sistemas e aplicações que usem IA além de ferramentas que permitam a monitoração e explicabilidade¹ dos modelos criados, evitando assim o viés e garantindo os princípios de ética.

 

¹explicabilidade ou inteligência artificial explicável (XAI) é um conjunto de processos e métodos que permite aos usuários humanos compreender e confiar nos resultados e na saída criados por algoritmos de machine learning.

 

Regulamentação

A visão dos engenheiros sobre a importância da segurança de dados e de privacidade é compartilhada pelo jornalista Danilo Macedo, líder de relações governamentais e assuntos regulatórios da IBM Brasil. Foi, inclusive, neste sentido que surgiu o Projeto de Lei 21/2020, que cria o marco legal do desenvolvimento e uso de inteligência artificial. O PL foi encaminhado ao Senado em dezembro de 2022 e tem perspectiva de aprovação este ano. Com isso, deverão ser estabelecidos princípios, direitos e deveres para a governança da tecnologia.

“Há discussões importantes que devem ser feitas antes de um texto final ser levado à votação”, ressalta Macedo. Ele acredita que é preciso uma inclusão maior nos debates de especialistas que estudam e vivenciam o uso de IA na prática, mostrando seus riscos e benefícios para a sociedade. “Como a IA está em constante evolução, as regras que regem seu desenvolvimento e implantação devem ser flexíveis o suficiente para evoluir junto com a tecnologia. Dessa forma, teremos uma regulação equilibrada e que promova a inovação no país”, finaliza.

 

Produzido pela CDI Comunicação