Crea-SP elabora parecer técnico sobre Favela do Moinho
5 de junho de 2025, às 14h33 - Tempo de leitura aproximado: 5 minutos
A desocupação da Favela do Moinho, iniciada há mais de 30 dias na capital paulista, é um exemplo claro de como a requalificação urbana e habitacional impõe sérios desafios à Engenharia. As condições das estruturas e a segurança das famílias residentes levantaram a pauta sobre a necessidade de uma visão técnica para mitigação de riscos no local. Foi isso que o Crea-SP fez ao entregar, à Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (SDUH) do Governo do Estado, um parecer que caracteriza a habitabilidade e os aspectos ambientais e sanitários da região, visando a proteção dos moradores ao amparar tecnicamente o processo.
O documento foi elaborado pelo Comitê Técnico Multidisciplinar de Requalificação Urbana e Ambiental da Região da Favela do Moinho, grupo criado especialmente para a demanda depois de tratativas do Conselho com o governo estadual para apoio técnico à atuação na comunidade. O conteúdo orientativo resultou da avaliação participativa de engenheiros civis, eletricistas, ambientais e de segurança do trabalho habilitados e registrados na autarquia.
As análises foram realizadas com base em vasta documentação da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo (CDHU), que serviu como fundamentação técnica e referência bibliográfica para o diagnóstico dos especialistas.
“Esse relatório é importante tanto para a cidade quanto para o estado de São Paulo, e consolida a atuação profissional da Engenharia a serviço público. Mais uma vez prestamos um suporte técnico necessário e efetivo para que a gestão pública possa tomar suas decisões com assertividade e respaldo. O Conselho acompanhará o processo de requalificação, da fiscalização do exercício profissional à parte técnica”, afirmou a presidente do Crea-SP, Eng. Lígia Mackey.
A região é ocupada organicamente desde a década de 1990. “As moradias consolidadas em caráter de autoconstrução têm fragilidades consideráveis, tanto em questões de atendimentos a requisitos técnicos de solidez e segurança, quanto de uso, manutenção e operação dos sistemas de água, esgoto e energia elétrica, com ligações clandestinas”, detalhou o coordenador do Comitê, Eng. Roberto Racanicchi.
As habitações ignoram a legislação vigente e os critérios mínimos das principais normas técnicas aplicadas em obras da construção civil, como o Código de Obras e Edificações de São Paulo (Lei 16.642/2017); o Código Sanitário de São Paulo (Lei 10.803/1998); a NBR 15.575/2013, que estabelece as condições a serem seguidas em edificações residenciais; a NBR 6.118/2007, de estruturas de concreto; a NBR 6.122/2019, de fundações; e a NBR 7.190/2022, de estruturas de madeira. Isso faz com que os espaços estejam ainda mais expostos, uma vez que foram executados sem conhecimento técnico ou direcionamento especializado.
As instalações elétricas sem controle de carga de distribuição ou sistemas de proteção revelam um outro perigo, o de incêndios. A Favela do Moinho já protagonizou casos emblemáticos de fogo em 2011, 2012 e 2015. A própria localização, entre os ramais ferroviários das linhas 7-Rubi e 8-Diamante, da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), dificulta o acesso e o atendimento emergencial, além dos demais riscos relacionados.
O cenário hidrossanitário segue pelo mesmo caminho. De acordo com as informações do parecer técnico, há despejo de efluentes a céu aberto e instalações de vasos sanitários comunitários para atender a mais de uma casa. Nenhum coletor para tratamento de esgoto foi identificado.
Silo do Moinho
O reservatório que abrigou a produção do Moinho Central — operado desde 1949 pela Moinho Fluminense da Santista Alimentos S.A. e, posteriormente, pela Alimentícia Bunge até sua desativação na década de 1980 —, segue em meio às construções. A estrutura, no entanto, feita em concreto armado há mais de 70 anos, merece atenção do poder público, pois não há indícios de manutenção preventiva, o que impõe ainda mais perigos aos residentes.
Os especialistas apontam que o envelhecimento dos materiais sem o devido acompanhamento e manutenção pode comprometer a segurança e funcionalidade do equipamento, uma vez que não existe avaliação periódica sobre as propriedades físicas e seus desgastes ao longo do tempo. Conforme trecho do documento: “(…) o silo encontra-se em condições desfavoráveis à sua estabilidade global, inclusive por deterioração dos materiais simples e compostos utilizados em sua construção. O marco local está em estado de ruína, por enquanto parcial”.
Em conclusão, a análise do Crea-SP sobre a região da Favela do Moinho indica a urgência de uma ação imperativa do poder público em abordagem integrativa para o reassentamento digno, respeitando os direitos sociais, com a destinação do espaço para alternativas de aproveitamento qualificado do ambiente disposto. O Comitê sugere, de forma unânime, que as ações priorizem a segurança e a dignidade habitacional, bem como a preservação da vida.
Presidente do Confea, o Eng. Vinicius Marchese lembrou que os esforços mútuos do Conselho paulista com a SDUH não são de agora. Os órgãos estiveram juntos no cenário emergencial vivenciado em fevereiro de 2023, durante a mobilização pelo Litoral Norte. Na época, o Crea-SP trabalhou com a pasta, especialmente em São Sebastião, para viabilizar o credenciamento de responsáveis técnicos para os serviços de Engenharia e Geociências na região, o que possibilitou a rápida construção de novas moradias destinadas às famílias vítimas dos deslizamentos de terra. “Essas cooperações nos aproximam ainda mais do poder público e da sociedade, permitindo a criação de projetos e políticas alinhadas à realidade da população com a tecnicidade necessária para alcançar os níveis de segurança ideais”, comentou Marchese.
“[O relatório] vai nos ajudar muito nas operações. Essa parceria é extremamente importante pela confiança que temos nos técnicos do Crea-SP e do Confea e em todos os engenheiros do estado de São Paulo e do Brasil que exercem o trabalho incansável de construção do país. Para esse projeto, estamos concentrando esforços para analisar as habitações e formas de vida da comunidade. Com o apoio do Conselho, podemos atuar de forma segura, tranquila e com toda a recomendação técnica”, destacou o secretário Marcelo Branco.
Produzido pela CDI Comunicação